Cortinas históricas que deveriam voltar a se abrir

O cinema em Frederico Westphalen

Existiu uma época em que os cinemas eram vistos como espaço de magia e pompa. Ir ao cinema era o principal meio de encontros, amorosos ou não. Evento importante, quase uma tradição. A maioria das cidades do interior possuíam salas de exibição, que somavam um público significativo. Na região, Frederico Westphalen tinha o principal cinema, que era referência em estrutura e quantidade de salas. A cidade reunia público de vários municípios próximos para as exibições.

Essa realidade começou a mudar ao fim de sua década de ouro, os anos 70, consequência das mudanças nos meios tecnológico, econômico e sociocultural. Um estudo de 2014 da Agência Nacional do Cinema (Ancine) revelou uma queda de 110 milhões na compra de ingressos da década 70 até os dias de hoje. No Rio Grande do Sul, apenas 7,86% dos municípios possuem cinema, sendo que a grande maioria está concentrada em cidades com mais de 100 mil habitantes. O estado tem o sexto preço médio de ingresso mais caro do país, que é de R$12,77. Apesar disso, a Ancine, em 2007, considerou a região sul privilegiada e menos concentrada com relação à distribuição geográfica das salas de cinema.

“O cinema sempre foi algo extraordinário. Na minha juventude eu era o maior frequentador, e ganhava ingressos por uns três anos seguidos. Porque se passavam 150 filmes por ano eu ia no cinema 150 vezes por ano. Não perdia um. Eu era ingresso garantido. Afinal, o que que tu ias fazer aqui na cidade? Mas foi um período muito bom. Cinema era o grande atrativo na nossa cidade”, contou Wilson Ferigollo, senhor cujos cabelos brancos denotam sua sabedoria e a experiência.

A história do cinema em Frederico

Wilson Ferigollo, que é historiógrafo de Frederico Westphalen e autor de diversos livros sobre a história da cidade, ajudou a contar a trajetória do cinema aqui, que está narrada a baixo.

Em 1940 nos primórdios da Vila Barril, nome de Frederico Westphalen antes da emancipação, a família Bortoluzzi montou um cinema, onde atualmente está localizada a farmácia Panvel. Naquela época, as exibições eram vigiadas e pré-censuradas, pelo Monsenhor Vitor Batistella. Não se sabe até exatamente quando este cinema funcionou, mas acredita-se que até meados de 1950, mesmo período em que o Monsenhor inaugurou um salão de festas nos fundos da igreja, lugar em que começou funcionar o Cine Carlos Gomes, onde as sessões não tinham periocidade definida.

Ainda em 1950 o Clube Harmonia permitiu que Dinar Pereira lá instalasse o Cine Floresta, que funcionou até 1955. Depois, em 1957, aos fundos da Catedral de Santo Ântonio foi construído um auditório para a Rádio Luz e Alegria, com cerca de 450 lugares. Como o Cine Carlos Gomes estava passando por dificuldades, o Monsenhor convidou Dinar a instalar seu cinema no salão paroquial, para assim manter sua vigilância nos filmes. O Cine Floresta funcionou no auditório até 1964, aproximadamente. Paralelo ao Cine Floresta, atuou outro cinema, o Cine Recreio, até 1960, onde hoje se localiza o Subway. Era um cinema pequeno, comandado por Aquiles Panosso.

Em 1963, Dinar Pereira mudou-se, porém, tinha começado a construção, onde hoje estão as Lojas Grazziotin, de um cinema com 900 lugares. Dinar vendeu essa construção à Justo Damo, que terminou o cinema, e então passou todo o equipamento do salão da Catedral para o novo local, renomeando-o como Cine Jussara, em homenagem a filha, de mesmo nome. Na época, serviu também como uma casa cultural, onde artistas se apresentavam em grandes shows. Lá circulou o Cine Fatos, que com quatro páginas foi o primeiro jornal da cidade e deu origem ao O Alto Uruguai.         

Registros do Cine Jussara – Arquivo de Wilson Ferigollo

O Cine Jussara funcionou então até 1990, tendo fechado as cortinas pela falta de frequência e alto custo dos filmes. Desde então não existiu mais nenhum na cidade. “Há quem queira colocar cinema, mas precisa de grandes investimentos, salas com construção especial, e trazer lançamentos também é caro”. Complementou Wilson.

Depoimentos

Maristela Cerato, de 46 anos, nos contou sobre suas recordações do Cinema Jussara, que frequentou em 1977. “Me recordo de pouca coisa, porque na época eu deveria ter 6 ou 7 anos. A minha lembrança mais nítida foi do filme Tubarão, que foi o primeiro filme que fui assistir. Tinha sessões matinais, nos domingos, sessões à noite que eram vetadas pra idade.” Maristela ainda lembrou que o fechamento do Cine se deu devido o início da era das vídeo-locadoras.

Segundo Eduarda Wilhelm, em seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), “Cortinas Fechadas: A trajetória dos cinemas de rua em Frederico Westphalen”, a existência do cinema na cidade sempre se manteve condicionada a empreendimentos familiares. As salas eram mantidas por pessoas que acreditavam na sétima arte e na possibilidade de mantê-la no interior. Eduarda não identificou algum tipo de incentivo público para manter o cinema do município na época, o que talvez tenha sido um fator de influência decisiva para o cenário atual, em que não há mais cinemas na cidade.

Custos

De acordo com a Rede Peperi de Comunicações, o cinema sempre enfrentou dificuldades, principalmente na questão financeira. O custo mínimo a ser investido atualmente é de um milhão de reais. Conforme os equipamentos, luxo das salas, do bomboniere, o preço do investimento pode chegar ao dobro. Isso só de uma sala. Os custos dos lançamentos variam conforme o porcentual de bilheteria: 50% do valor arrecadado fica para a companhia, proprietário de cada filme, 10% para os gastos da programação dos filmes, e para o cinema os 40% restantes. Há ainda de se levar em conta os gastos que todas salas de cinemas, indiferente do tamanho da cidade tem, como aluguel, energia, manutenção, entre outros.

Necessidade atual

Nos dias de hoje, Frederico Westphalen configura-se como uma cidade universitária, contando com quatro instituições de ensino superior, em que a maioria dos estudantes são originários de outras cidades e, às vezes, estados. Uma vez que os cinemas sempre tiveram como maior público os jovens, a equipe da reportagem realizou uma pesquisa com os que aqui estudam, universitários e secundaristas, natais da cidade ou vindos de fora, a fim de analisar sua demanda, ou não, por esse ambiente cultural. Dentre os 41 jovens entrevistados, 70,7% vieram de fora, sendo que destes 29% contam com salas de cinema em suas cidades. Porém quando perguntados se sentiam carentes desse espaço, apenas um respondeu nunca ter pensado nisso, enquanto os outros 40 afirmaram que sim, sentiam falta de um cinema aqui.

“Eu sempre fui pelo menos uma vez ao mês no cinema, é muito mais emocionante para mim assistir filmes naquela telona, confesso que sinto falta disso aqui em Frederico Westphalen, a cidade é boa, mas ainda falta se desenvolver muito na questão de oferecer cultura aos seus moradores.”, relatou Mayara Neri, que veio de São Paulo capital este ano para estudar.

Cidades próximas à Frederico Westphalen no estado, como Palmeira das Missões e Seberi contam com salas de cinema, mesmo que os filmes rodados não sejam lançamentos. Em Santa Catarina, as cidades de São Miguel do Oeste e Chapecó, que são próximas daqui oportunizam assistirmos aos lançamentos.

Investimento Público

Segundo Graziella Fontoura, desde que assumiu o cargo de gerente municipal de convênios, nenhuma proposta na área da cultura foi cadastrada no sistema de convênios do governo federal, o SICONV, pela não abertura de editais específicos pelo Ministério da Cultura. Outro motivo citado pela gerente é a falta de interesse político, pois na maioria das vezes os esforços, investimentos e propostas de emenda parlamentar são destinadas a outras áreas, como educação ou agricultura, por exemplo.

Em contrapartida a essa falta majoritária de interesse político, o governo municipal, em 2013, solicitou a análise e repasse para um projeto de construção de um centro de cultura ao Estado, que não retornou. Também houve a tentativa, durante o governo anterior, de se instituir um departamento de cultura, já que a prefeitura nunca contou e ainda não conta com um. “Tenho filhos adolescentes e não se tem nada de cultura, tem-se que começar implementar uma política pública. Falta investimento público, falta investimento privado, falta tudo.” Encerrou, Graziella.

Franciéli B. de Moraes
Simone Philipsen

Redação Jornalística II

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