Além das Fronteiras

Busca por crescimento pessoal e profissional no exterior é uma das principais motivações dos intercambistas

Débora Franke e Natália Menuzzi

debora.franke101@gmail.com; nataliamenuzzi@hotmail.com

Uma nova experiência, uma nova cultura, um novo aprendizado. É isso que inúmeras pessoas buscam hoje em dia quando realizam um intercâmbio. Aliás, você sabe o que é um intercâmbio? Segundo o dicionário Aurélio, a palavra significa uma troca de relações de ordem cultural, comercial e social. Mas, essa experiência vai além de um simples conceito. Afinal, passar um período fora do seu país de origem, conhecendo outro lugar, seja com objetivos profissionais, acadêmicos ou pessoais, é sempre desafiador.
A aquisição de conhecimento e a integração em um sistema internacional é o principal estímulo de quem deseja embarcar nessa aventura. O aprendizado de uma língua estrangeira e o contato com a diversidade cultural que essa troca proporciona são apenas algumas das funções que o intercâmbio proporciona aos indivíduos. Essa prática teve início por volta do século XIX, no momento em que as famílias com alto poder aquisitivo da Europa, enviavam seus filhos para estudar fora do país. Muitos, com o objetivo de evitar conflitos familiares da época, uniam o útil ao agradável e faziam com que os seus filhos fossem morar fora e consequentemente adquirir um universo de conhecimento em universidades renomadas.
No Brasil, a origem do intercâmbio e a popularização do mesmo começaram por volta de 1960, em decorrência das organizações sociais criadas no território, que desenvolviam atividades humanitárias, com o intuito de prezar pela vida e pela diversidade cultural no mundo. O Rotary e o Lions Club são exemplos de clubes que ainda praticam esse tipo de atividade atualmente.
Com o ápice da tecnologia e das teias de comunicação, a facilidade em obter informações se tornou imensa. Por isso, hoje o que era um sonho distante tem se tornado realidade para muita gente. Há diversos serviços disponíveis que auxiliam e amparam quem deseja realizar esse tipo de experiência, de acordo com os recursos de cada um.

As experiências fora do país de origem 

Intercâmbio antes dos 18?

Ambiciosa, com apenas 17 anos foi em busca de novas oportunidades na cidade de Nanaimo, no Canadá, no ano de 2015.

Realizar um intercâmbio exige coragem, e coragem é o que não faltou para a fotógrafa Júlia Dala Rosa, de 19 anos. Ambiciosa, com apenas 17 anos foi em busca de novas oportunidades na cidade de Nanaimo, no Canadá, no ano de 2015.
A menina ficou três meses frequentando aulas do Ensino Médio, conhecido como High School, e conta que escolheu o Canadá por ser um dos países de referência em ensino no mundo. “Na escola haviam várias opções de aulas extracurriculares e clubes, era muito diferente das minhas aulas no Brasil. Dentro da escola pude conhecer intercambistas da Turquia, Espanha, Alemanha e Japão”.
A estudante conta que foi bem recebida na cidade e que se surpreendeu com a educação e prestatividade dos canadenses. “Às vezes eu pedia desculpa por falar alto e encostar a mão na pessoa com quem estava conversando, mas eles diziam que já estavam acostumados com esses hábitos brasileiros”.
Como ponto negativo do intercâmbio, Júlia citou o fato de ter se hospedado em uma casa muito longe do centro, o que dificultava passeios, mas apesar disso criou laços com a família hospedeira. “A família foi muito acolhedora, me aproximamos muito rápido”.
Apesar de ter estudado em uma escola de inglês por muitos anos, a estudante considera o intercâmbio essencial para a prática da língua. “Aqui no Brasil a gente aprende mais a escrita e a leitura, lá você precisa praticar a conversação todos os dias”.
Júlia conta que viajou com muitos medos e incertezas, mas considera o intercâmbio como uma fase de amadurecimento. “Saí da minha zona de conforto e tive que me virar sozinha. Aprendi muitas coisas em um curto período de tempo, então esse período agregou muito para minha vida profissional e pessoal”.

De Frederico Westphalen para Portugal

Para o estudante, todas as expectativas geradas antes do intercâmbio foram superadas.

Estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Santa Maria – Campus Frederico Westphalen (UFSM-FW), Thiago Henrique de Aguiar Silva, 24 anos, encarou, no primeiro semestre de 2017, a experiência de morar fora do Brasil. O paulista, natural de Guaratinguetá, passou três meses estudando na Universidade da Beira Interior (UBI), na cidade de Covilhã, em Portugal. “A cidade em que eu fiquei é pequena, parecida com Frederico Westphalen, mas fica situada na serra. Boa parte da população é de estudantes que vem de fora.”
Segundo Thiago, três fatores contribuíram para a escolha de Portugal como destino. “O custo de vida em Portugal é mais barato que em outros países da Europa, além disso, há uma facilidade com o idioma e a cultura é parecida com a do Brasil, então eu não teria um choque cultural tão grande”.
Apesar do português falado no Brasil ter similaridade com o de Portugal, as línguas possuem diferenças que foram sentidas pelo estudante nas primeiras semanas de intercâmbio. As aulas eram ministradas na língua local, mas palestras eram dadas na língua inglesa. “Eu tinha certa dificuldade em entender a língua, porque os portugueses falam de modo diferente, isso dificultava o entendimento das disciplinas no começo e algumas palavras possuem significado diferente aqui no Brasil e lá”, relata Thiago.
Além das duas matérias que cursou com a turma de graduação, Thiago pode fazer disciplinas direcionadas aos estudantes de Mestrado. “Procurei fazer disciplinas práticas, então optei pelas aulas de Práticas Jornalísticas e Jornalismo Especializado, nas duas pude desenvolver o conhecimento que tinha com jornalismo esportivo”.
Thiago relembra que no primeiro dia na Universidade houve uma recepção para todos os intercambistas, que vinham de países como Rússia, Turquia, Espanha, África, Argentina e México. Além de conhecer pessoas de outros países ele também teve a oportunidade de fazer amizade com brasileiros de vários estados. “Os brasileiros ficavam unidos, porque a gente encontra um conforto um no outro. Um sabe fazer pão de queijo, o outro chimarrão, então acontece essa integração”.
Para o estudante, todas as expectativas geradas antes do intercâmbio foram superadas. “É algo que você conhece só vendo pela internet ou pela televisão, mas quando você está lá, você não acredita no nível de cidadania que eles têm, do nível cultural, de conhecimento”.
Thiago conheceu apenas outras duas cidades de Portugal, Porto e Lisboa, mas acredita que o intercâmbio acrescentou muito para a carreira profissional e acadêmica. “Foi uma grande experiência pra mim, porque eu passei por uma ascensão pessoal e cresci no sentindo acadêmico porque pude fazer disciplinas que não conseguiria fazer aqui”.

2924 km de distância é pouco para quem deseja realizar sonhos

Rafael relembra a prática que obteve no exterior durante o sétimo semestre do curso de Comunicação Social – Relações Públicas.

Argentina, segundo maior país da América do Sul, cidade de Buenos Aires. Esse foi o destino que Rafael Foletto, escolheu para realizar um intercâmbio durante a graduação. A experiência que aconteceu em 2008, foi vivenciada na Faculdade de Comunicação da Universidad de Buenos Aires (UBA), através do programa da Associação de Universidades do Grupo Montevidéu (AUGM), que promove intercâmbio entre estudantes de universidades públicas dos países do Mercosul e Chile. Atualmente, professor-doutor do Departamento de Ciências da Comunicação da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Campus Frederico Westphalen, Rafael relembra a prática que obteve no exterior durante o sétimo semestre do curso de Comunicação Social – Relações Públicas e destaca a relevância de uma experiência como essa para o crescimento pessoal. “O intercâmbio é uma experiência importante não apenas para a construção da trajetória acadêmica e profissional, é a oportunidade do contato com outra realidade cultural e organizacional, é a inserção de outras concepções de universidade, de ensino e pesquisa. Certamente esse diálogo e essa troca de conhecimento é um acréscimo pessoal e intelectual na trajetória do estudante”.
Embora tenha feito um planejamento antes de embarcar e conversado com pessoas que já haviam realizado intercambio para o mesmo lugar, o professor-doutor acredita que a inserção no contexto local é um dos maiores desafios de adaptação dos intercambistas. “É preciso se adaptar e se organizar rápido, tentando entender o dia a dia do país no qual se está vivendo, os fazeres das pessoas, a burocracia do Estado. Tudo isso precisa ser assimilado em pouco tempo, pois é preciso se organizar da melhor forma para aproveitar bem essa oportunidade.”
Para Foletto, a experiência de estudar fora do país foi extremamente positiva. Parte da aquisição de conhecimento que obteve durante o intercambio e das disciplinas cursadas, acabaram o estimulando a pensar na pós-graduação, caminho no qual seguiu posteriormente na sua carreira acadêmica/profissional. O professor destaca ainda que, “o principal resultado do intercambio é o desenvolvimento pessoal, e que, tomar as próprias decisões em um país diferente, com uma cultura distinta, contribui diretamente para o amadurecimento e crescimento”.

Uma nova visão de mundo

O destino do advogado foi à cidade de Lisboa, em Portugal, onde vivenciou a primeira experiência de estudar fora do país.

Mestrando em Ciências Jurídicas pela Universidade Autônoma de Lisboa, Raphael Urbanetto Peres, advogado criminalista e professor na Faculdade Metodista de Santa Maria (FAMES), nas áreas relativas ao Direito Penal e Direito Processual Penal, relata parte da sua experiência no exterior.
O destino do advogado foi à cidade de Lisboa, em Portugal, onde vivenciou a primeira experiência de estudar fora do país. Raphael realiza um Mestrado em Direito no período de férias, com duração de dois anos, onde a cada seis meses, passa um intervalo de tempo de aproximadamente um mês dedicado à pesquisa.
Quando questionado acerca das expectativas que tinha antes do embarque, bem como as perspectivas que obteve depois, Raphael relata que ter a oportunidade de estudar fora do país é totalmente diferente do contato turístico que se conhece habitualmente. “Quando você tem esse tipo de oportunidade, é impossível não mudar as perspectivas que você tem, sejam elas pessoais ou profissionais. Hoje, por exemplo, noto que a cada orientação de trabalhos curriculares dos meus alunos, consigo contribuir e repassar inúmeras perspectivas a eles, e é impossível fechar os olhos e não colocar em prática todo o aprendizado econhecimento adquirido nessa experiência”.
Raphael, que teve como linha de pesquisa e investigação dos estudos o encarceramento feminino, conta ainda que conseguiu analisar as interfaces do Direito em diferentes contextos, sob a perspectiva de diferentes países, o que enriquece a bagagem de conhecimento na área. “A experiência que eu tive lá na universidade, e em especial dentro das penitenciarias portuguesas, me mudaram como cidadão, como professor, e principalmente a minha visão de mundo”.
Embora o crescimento pessoal que esse tipo de experiência proporciona seja de extrema relevância para a vida pessoal, acadêmica e profissional, o advogado relembra um velho e bom ditado popular brasileiro, de que quem faz o curso é o aluno. Nessa perspectiva, acredita que estudar fora do país, não é determinante para conseguir sucesso ou estabilidade. “A cultura brasileira da baixa autoestima faz com que a ideia e o fato do cidadão estudar lá fora, o torne melhor que os outros, pelo simples fato de ir. Mas, na verdade o que realmente importa nessa experiência não é o lugar, e sim a busca pela diferença, pelo envolvimento com o que se está fazendo, pela entrega e pelo objetivo do aprendizado”.
Para Peres, a experiência em Portugal que ocorreu mais de uma vez, foi extremamente positiva. Mesmo com a diversidade cultural encontrada, e com os desafios cotidianos e clichês encontrados fora do país de origem, o período em que esteve inserido no sistema internacional de ensino, contribuiu diretamente para o seu desenvolvimento pessoal, acadêmico e profissional. Além disso, destaca a receptividade encontrada no país de destino. “Tive a oportunidade de conhecer grande parte da Europa, ter contato com uma diversidade de conhecimento e cultura, além disso, a receptividade das pessoas, sobretudo em Portugal, foi um marco positivo nessa trajetória”.

Évora: um patrimônio mundial histórico e encantador

Para a professora-doutora, fazer um intercâmbio propicia ao indivíduo a capacidade de se tornar parte de um sistema internacional de aprendizagem e de conhecimento.

Graduada em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), com Mestrado em Engenharia de Produção e doutorado em Desenvolvimento Rural, Tâmara Silvana Menuzzi Diverio, natural de Santa Maria, Rio Grande do Sul, optou por cursar um pós-doutorado em Economia no exterior.
A experiência teve duração de dois semestres em 2014 e foi realizada pelo Programa Nacional de Pós Doutorado da CAPES na Universidade de Évora, situada na região do Alentejo, em Portugal. O Estágio Pós-Doutoral tinha como ênfase as Ciências Sociais Aplicadas, com foco na economia internacional, na política comercial e na integração econômica.
Para a professora-doutora, fazer um intercâmbio propicia ao indivíduo a capacidade de se tornar parte de um sistema internacional de aprendizagem e de conhecimento, o que poderá contribuir para o seu desenvolvimento intelectual. “O intercâmbio além de ser um aprimoramento do senso crítico, implica alteração de estrutura e mentalidades, é poder refletir sobre as diversidades culturais de outros países, incluindo a de seu país, é questionar-se e aprender”, relata Tâmara.
Quando questionada sobre as percepções da sua experiência internacional, a professora-doutora relata que antes da viagem tinha muitas expectativas de encontrar uma Europa com realidades muito prósperas, ou seja, “outro mundo”. No entanto, com o passar do tempo e a convivência diária, começa-se perceber as particularidades de cada lugar e que cada país tem seus problemas e muitas vezes são muito parecidos com os nossos. O desemprego e a crise, por exemplo, eram preocupações do dia a dia das pessoas. Entender como se dá este contexto é de extrema importância para o aprendizado do intercambista.
A professora também destaca que além da troca de informação e possibilidade de aprimorar conhecimentos que se obtém estudando fora do país, à construção de aprendizado é cotidiana e não se limita apenas a esfera acadêmica e/ou profissional e salienta que, ao realizar as tarefas diárias, como ir ao supermercado fazer compras, conversar com os vizinhos, entender a cultura local e, sobretudo, como as pessoas ali vivem, é de extrema importância para o aprendizado e para a adaptação social, fazendo com que a construção de saberes seja constante.
A economista, que já atuava na área econômica internacional antes mesmo do intercâmbio, afirma que a experiência foi totalmente positiva e que faria tudo de novo. “Permitir-se ter uma mente aberta com relação a outros povos e culturas, aprender a comunicar-se com pessoas de outras religiões e costumes, valorizar as pequenas coisas e aprender a viver com pouco, é um aprendizado de vida”.

Próxima parada: Peru

Você teria a disposição de deixar as festas de final de ano com a família de lado para embarcar em uma aventura junto com pessoas desconhecidas? Pois é isso que a estudante de Administração, Maria Luiza Zimmermann Strobel, de 19 anos, vai fazer. No mês de Dezembro a gaúcha vai viajar para a cidade de Arequipa, localizada no sul do Peru.
A viagem por si só já seria uma aventura, mas Maria quis ir além. Apesar da pouca idade, a menina sempre teve a vontade de realizar um intercâmbio voluntário. “O intercâmbio sempre foi um sonho meu, apesar da relutância da minha família, porque essa é a primeira vez que viajo sozinha para o exterior”.
Ao contrário da viagem turística, com roteiro fixo e guia, o intercambista voluntário tem a oportunidade de conhecer destinos diferentes e se inserir no dia a dia da cidade, além de contribuir para o desenvolvimento do país de destino.
Durante sua estadia de 45 dias, Maria vai participar de um projeto envolvendo crianças peruanas, que pretende reduzir o bullying através de um ambiente que impulsione a força dos jovens pela autoconfiança, trabalho em equipe e liderança, por meio de dinâmicas e oficinas. O grupo de voluntários que a estudante fará parte trabalhará um turno diário, de segunda a sexta, em ONGs e escolas, atendendo crianças de 5 a 18 anos.
A intercambista de primeira viagem vai ficar hospedada na casa de uma família local e procurou buscar dicas e orientações com outros estudantes que foram para o mesmo destino, com o objetivo de conhecer melhor o país.
Segundo Maria, a escolha pelo voluntariado surgiu da vontade de ajudar outras pessoas e, dessa forma, ela acredita que vai conseguir desenvolver autoconfiança e crescimento pessoal. “Eu queria sair da minha zona de conforto, porque eu sou muito tímida e sei que lá eu vou ter que desenvolver isso. Vou precisar falar uma língua que eu não conheço e fazer amizades com pessoas de outros países”.

*Reportagem produzida na disciplina de Redação Jornalística 2  como parte do jornal-laboratório online da turma.

Leia outros textos em: http://decom.ufsm.br/redajor2

Sobre o autor

nataliamenuzzi
Estudante de Jornalismo na Universidade Federal de Santa Maria /campus Frederico Westphalen, Rio Grande do Sul, Brasil.

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