Cine da Hora – V Festival Internacional de Cinema da Fronteira #1

Amor, Plástico e Barulho: (Sem Amor, Algum Plástico e Muito Barulho)21038630_20130910191951093.jpg-r_640_600-b_1_D6D6D6-f_jpg-q_x-xxyxx

Abrindo a mostra competitiva do Festival de Cinema da Fronteira, realizado em Bagé, o filme “Amor, Plástico e Barulho” foi exibido na segunda-feira (25/11) à noite. O longa pernambucano conta a história de Shelly e Jaqueline, duas cantoras de tecnobrega em busca de sucesso. Inseridas em um mundo onde tudo é descartável, elas vivem uma trajetória difícil de sobrevivência e luta pela sua arte.

Utilizando-se de clipes do youtube e filmagens amadoras inseridas no decorrer do filme, a história tenta mostrar como são feitos os hits de hoje em dia. Acerta ao fazer uma critica a esse modelo de videoclipe, que sem conteúdo fornece apenas um amontoado de cenas amadoras filmadas sem nexo algum, onde a principal regra é aparecer, seja em clipes musicais ou programas de auditório que ridicularizam seus convidados.

O filme tem uma estética suja, mostrando o lado B da juventude pernambucana, com suas principais locações se dando no subúrbio. Fica evidente a vontade de expor a favela, entrando na periferia da cidade, ambientando suas personagens nos palcos do nordeste ao ritmo do tecno-brega.

Tecnicamente, o longa tem seus altos e baixos. A direção é um tanto confusa, principalmente na questão dos atores. Cortes desnecessários e planos confusos evidenciam uma montagem ainda pior. A fotografia é discreta em algumas cenas e exagerada em outras, principalmente nos números musicais.

Mas de longe é no roteiro que estão as maiores falhas do filme. A divisão de protagonismo entre as duas dançarinas não é bem feita. Em alguns momentos temos Shelly como foco, em outros Jaque, sendo que nenhuma das duas personalidades é bem construída e estruturada. Temos duas protagonistas rasas e sem contexto, jogadas em um roteiro vazio e com muitas cenas soltas.

O que poderia ser pior, pois muitas dessas falhas são amenizadas pela brilhante atuação de Maeve Jinkings. Carregando o elenco nas costas, ela faz milagre e consegue dar alguma camada de profundidade a sua personagem, embora ainda muito prejudicada por um roteiro limitado. Não é sempre que vemos alguém recitar dramaticamente com lágrimas nos olhos a letra “Chupa que é de Uva”.

Por Aqui Tudo Bem: (Por aqui também)

116368_tmdbNo segundo dia de Festival (26/11), como forma de complementar uma palestra sobre Eixo Lusófono foi exibido o filme “Por Aqui Tudo Bem”, da diretora Pocas Pascoal. O longa retrata uma realidade muito específica, a migração de pessoas de Angola para Portugal na década de 80. Realidade esta que chega até nós através do olhar de duas garotas: Maria e Alda, irmãs que rumam sozinhas para Lisboa fugindo da guerra civil que assola seu país.

É um filme de descobertas. A trajetória das garotas, jogadas à própria sorte em um país estranho, é um meio que as faz evoluir como pessoas. É perceptível o desenvolvimento de personalidade de ambas durante o longa, ao final são pessoas completamente diferentes daquelas que começaram o filme.

A vida ensina, para elas a necessidade é uma forma de aprendizado. E aprendem a lição mais importante de suas vidas, confiar uma na outra sempre. Seria impossível qualquer uma sobreviver sem a outra, e é nesta irmandade que tiram forças para superar os muitos problemas que as esperam.

A diretora trata ainda de muitas questões que envolviam os africanos na época, como preconceito por parte dos portugueses, a insegurança de estar fora de sua terra natal mostrando a dúvida de se vale a pena voltar para o seu país sabendo das péssimas condições de vida ou se é melhor tentar a sorte em terras estrangeiras.

Todos estes pontos são vividos por Maria e Alda, que como duas adolescentes inexperientes têm muito mais descobertas a fazer. A questão da sexualidade é abordada de maneira crua, mas cômica, o que faz um bom contraponto com o restante do filme, que se baseia praticamente apenas no drama.

O roteiro é fechado sem muitos rodeios ou reviravoltas, o que o faz ser eficiente para o que foi proposto, mas também evita maiores surpresas ou emoções. As duas atrizes principais estão bem, pois conseguem sustentar o filme praticamente sozinhas, apesar de não terem sido muito exigidas.

“Por Aqui Tudo Bem” faz o que veio para fazer, sem muitos erros graves se mantém na média. Mas não se permite ousar, e essa rigidez transcende a tela, por muitas vezes tornando o filme frio e seco. Com uma dose a mais de emoção e um pouco de audácia, teríamos um filme mais confortável de se assistir e se emocionar.

O Tempo e o Vento: (Faltou Tempo, Sobrou Vento)

O maior épico brasileiro dos últimos anos tem cara de blockbuster hollywoodiano e carrega a difícil tarefa de adaptar uma das maiores 21028920_20130817165717012.jpg-r_640_600-b_1_D6D6D6-f_jpg-q_x-xxyxxobras da literatura deste país. O Tempo e o Vento conta a história da família Terra-Cambará, desde seu surgimento passando por toda sua árvore genealógica.

O filme é grandioso, elenco estelar, superprodução e orçamento alto para os padrões brasileiros. O que se justifica, pois é tecnicamente impecável e visualmente perfeito, havendo somente elogios para fotografia, direção de arte e figurino. Obviamente, assistir ao longa no local em que foi filmado, Bagé-RS, conta muito para o fator ambientação. É de uma simbologia de imagens e detalhes sem igual, com o século XIX sendo muito bem retratado em cena.

A maior dificuldade aqui é conseguir condensar em 120 minutos todos os acontecimentos da obra de Érico Veríssimo. Naturalmente, por se tratar de uma adaptação muita coisa fica de fora, mas é visível a dissonância entre os atos do filme. Sua primeira parte é praticamente narrada em off e conta com poucos diálogos. O segundo ato é realmente onde o filme acontece e a história é apresentada com maiores cuidados. Mas o terceiro ato é corrido demais, fazendo com que muitos espectadores que não tinham conhecimento prévio da obra ficassem sem entender algumas coisas.

Quanto aos personagens, o destaque é todo de Rodrigo Cambará, que só aparece em tela no segundo ato, mas assim que o vimos sabemos que a partir de ali a história irá engrenar. Embora Thiago Lacerda comece um tanto tímido e retraído nas primeiras cenas, se solta naturalmente no decorrer do filme, tomando-o para si. Marjorie Estiano não tem muito o que fazer com sua Bibiana, pois o roteiro não lhe da espaço algum, mas mesmo assim consegue convencer em seu romance com o Capitão. Juntamente com Fernanda Montenegro, ambos os atores compõem a base das melhores atuações do filme.

Porém, a grandiosidade cobra seu preço. Analisando em um contexto geral, o longa se torna megalomaníaco, pecando por excessos. Excesso de personagens, excesso de histórias, excesso de vaidade. Ou se cortam partes do livro a fim de formar uma narrativa cinematográfica ou se desenvolvem essas partes de maneira correta dentro do filme. O Tempo e o Vento tenta mostrar mais do que pode, mais do que as suas 2 horas permitem. Deste modo, seu maior conflito foi com o tempo. Enquanto cinema, não foi desta vez, mas já é um grande passo para as produções de época brasileiras que estão cada vez mais escassas no mercado atualmente.

 

Marcelo Silva / Da Hora

 

 

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