Liberdade de imprensa: como os jornalistas se sentem?

Diante de tantos ataques à liberdade de imprensa, muitos comunicadores sentem-se acuados a publicar certas informações. O clima de censura aliado à impunidade de alguns casos levam alguns jornalistas a preferirem deixar engavetadas certas informações.

Segundo a jornalista pela Rede Paranaense de Comunicação (RPCTV) e presidente da Associação Beltronense de Imprensa, Micheli Arenza, o jornalista atual ainda sofre muitas pressões de diversas áreas e a ameaça à liberdade é presente, mas o profissional deve ser firme e trabalhar no que acredita. Ela também acredita que está mais fácil lutar contra o cerceamento à liberdade de imprensa, porque as pessoas andam mais informadas e inconformadas, e as redes sociais deram voz aos que não toleram mais ser manipulados.

“Como presidente da associação Beltronense de imprensa, a ABI, no último ano, tive de emitir duas notas de repúdio por ataques à colegas. A primeira foi quando um jornalista de uma rádio aqui foi ameaçado e quase agredido fisicamente por divulgar o que estava acontecendo com o time de futebol da cidade [Francisco Beltrão/Paraná] e a outra foi quando uma equipe da TV Tarobá foi feita refém por sem-terras em Quedas do Iguaçu-Paraná tentando fazer seu trabalho”, comenta Micheli.

Para a jornalista e assessora de imprensa Daiana Pasquim, a liberdade de imprensa é respeitada nos dias atuais especialmente quando se refere ao poder de domínio que os grandes meios de comunicação exercem. “Creio que a questão a ser debatida aqui é que tipo de liberdade a imprensa faz uso, pois é uma relação que tem muito a ver com influência econômica. As grandes redes de comunicação são em grande medida influenciadas pelos investidores”, comenta Daiana.  Segundo ela, a influência econômica pode ficar mais visível em alguns meios, como velada em outros, entretanto é algo que sempre existe.

 

Liberdade seletiva – por Daiana Pasquim

Quem assina, quem anuncia, quem compra ou vende ações ou produtos, vai tentar cercear uma notícia se esta lhe prejudicar; bem como tentar colocar uma notícia se lhe beneficiar. E aí você me pergunta: os veículos colocam? A resposta é sim: alguns mais escancarados, outros mais disfarçados; porque os veículos ainda aproveitam estas oportunidades ‘convenientes’ para vender mais anúncios, comerciais ou veicular merchandising, ou ainda, obter algum benefício em prol da instituição, ainda que em forma de permuta. A vida de um meio de comunicação, em especial em cidades fora das capitais, passa muito por isto, com o próprio jornalista tendo de executar pautas comerciais, em meio às suas pautas ‘quentes. É desta liberdade de imprensa que estamos falando. Você pode sim fazer uma excelente matéria, de denúncia, que vá colaborar com toda uma população, divulgar coisas de utilidade pública, mas desde que se sujeite a sustentar essas relações capitalistas também. Se você é contratado por um meio de comunicação ficará difícil se livrar. Se você tem sua própria empresa de comunicação, caberá decidir por sua conta.

Quando você é censurado al alguma matéria se revolta, se chateia, diz que não vai mais trabalhar naquela rádio, naquele jornal, naquela TV, que não vai mais atender aquele cliente, mas de repente, chegam as contas para pagar; a grande mídia notícia as facetas da crise e você se vê “conformado” a ter uma noite de sono para no outro dia recomeçar tudo outra vez.  Propinas e prostituição são duas das coisas mais comuns de uma sociedade: em todos os níveis ou setores. A nossa classe não é unida, tem muito de cada um fazer a sua carreira, obter o seu destaque, sempre houve e sempre haverá concorrência – mesmo no interior, temos aqueles com síndrome de Clark Kent que querem ser os heróis, terem seu nome comentado – de notícias e de ego.

 

Dois dos casos que mais me marcaram foi na redação do jornal Diário do Sudoeste, os dois envolvendo resíduos. O primeiro caso, fui fazer uma reportagem da superlotação do aterro sanitário e na hora de fotografar as montanhas de lixo, vi alguns sacos de lixo comuns com seringas, luvas, gazes ensanguentadas. Chegando na redação, após algumas ligações, zooms no photoshop, descobri que o lixo hospitalar era de um hospital da cidade. Minha editora e eu acionamos o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e entrevistei a direção do hospital. Foi um Deus nos acuda, mas a matéria de capa saiu. Lembro que fim de tarde, naquele exaustivo dia, o diretor do jornal chegou na redação dizendo que tinha acabado de receber uma ligação do diretor do hospital pedindo pela não-publicação. Mas segurou esta e afirmou que íamos publicar sim, pois se tratava de uma questão muito maior de saúde pública. Claro que tiraram um pouco da emoção exacerbada de meu texto, mas ainda assim fiquei feliz porque a reportagem contribuiu com o ajuste de conduta em relação ao destino do lixo hospitalar, salvamos o meio ambiente.

Uma outra denúncia que investiguei foi sobre lixo de oficinas mecânicas: óleos, tintas, até restos de para-choques de caminhões, pneus, etc; em um terreno baldio do bairro Aeroporto, em Pato Branco. Fui ao IAP, voltei no terreno com o investigador ambiental. O azar da empresa é que junto com toda esta sujeira que deveria seguir uma normativa de destino ambientalmente correta, havia notas fiscais; e o IAP foi direto à empresa, autuou e após alguns dias o lixo foi recolhido. Este caso foi mais forte de tentarem proibir a publicação da matéria, porque eram nossos anunciantes, mas as provas contra a empresa eram evidentes e mais uma vez o jornal peitou e publicou. Nestes dois casos, tive estresse mais tive sucesso. Há muitos textos que não saem mesmo… e isto não deveria ser rotina. Mas, agora como assessora de comunicação, posso te falar que para uma televisão ir fazer cobertura num evento que uma instituição particular que atendo com minha agência realizará, os próprios jornalistas desta TV vão me cobrar o anúncio “x” que a instituição deixou de fazer numa EXPOPATO, por exemplo. Isto é real.

Casos de correspondentes internacionais são os que mais ficamos sabendo no quesito “violação de integridade física”, mas às vezes acontecem casos que chocam uma região, como aqui no Sudoeste o caso do radialista que foi assassinado. Mas dá para você ser jornalista e sair de casa feliz, fazer excelentes pautas, constituir uma família, ser feliz trabalhando, voltar para casa realizado. Vai ter aquela fase profissional que o seu nome vai ser bem conhecido; e vai ter o momento que as pessoas vão te respeitar pela reputação que você construiu baseada em ética, nas atitudes um dia de cada vez.  Não vamos ser santinhos. Há casos inúmeros em que o abuso é da própria imprensa, como no Caso Escola Base Os Abusos da Imprensa, de Alex Ribeiro. Este é um dos mais perversos acontecimentos já promovidos pelo jornalismo no Brasil.

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Wellington Hack – Agência Da Hora

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