Richard Galliano mostra toda a versatilidade do acordeón francês
Na boca da Praça Coronel Pedro Osório, centro histórico de Pelotas, um domo geodésico prateado pontua a entrada da Rua do Jazz. Secundado por um estreito corredor dos casarões centenários o espaço vai sendo rapidamente ocupado por uma população heterogênea que vai se aproximando, carregando cuias de chimarrão, garrafas térmicas, água e muita disposição para a maratona de sons que se aproxima. Em quinze minutos, começará a primeira noite de shows do Pelotas Jazz Festival.
De preto, da cabeça aos pés, com óculos de astes e aros também escuros, e um indefectível cachecol alaranjado e colorido no pesçoco Richard Galliano, 64 anos, brincava com seu acordeon Vitória Botton, preto, com uma tranquilidade e destreza incomun. Junto a ele, três gaiteiros gaúchos estavam em estado de graça. O veterano Luis Carlos Borges, o gaiteiro pelotense Aluisio Rockembach e o músico de uruguaiana Guilherme Goulart eram os convidados do mousier Galliano, considerado como um dos melhores acordeonistas do mundo. Na sua apresentação, não se viu, ouvui e sentiu nada menos do que isso. Parceiro do Astor Piazzolla, compositor argentino que renovou a linguagem do tango e da milonga alcançando fama mundial, Gallianou amassou o fim de tarde com as composições do mestre argentino. Passou de uma milonga portenha emocionada em si prórpia para uma alegria valseada de Paris ensolarada em suas ruas cansadas do tempo.
E como quem toca Hermeto Pascoal, toca Bebê, Galliano tocou Bebê. Em acordes de luz, o francês dobrava os joelhos e revirava os olhos escondidos em óculos. Arrematou com Verão Portenho, outra de Piazzolla, de fazer a platéia perder o fôlego, em quebaras agéis e melodicamente inatacáveis.
A seguir, Galiiano revezou-se no palco com seus convidados, alternando duos e generosos solos para cada um dos gaiteiros gaúchos. Primeiro Guilherme Goulart colocou ao lado do acordeón francês o som da gaita apianada, criando diferenças de sons, timbres e recursos.
Já Luis Carlos Borges ocupou o microfone para cantar a música Para Dominguinhos, acompanhado por Galliano. O mais famoso sanfoneiro brasileiro, o pernambucano Dominguinhos, foi onipresente na palco, ao lado, claro de Piazzolla. O último convidado, Rochenbach, novamente buscou inspirações na melodias do argentino.
– Existe o que as pessoas normais tocam e existe o Galliano. É algo distinto. Eu nunca tinha visto ele e me pediu para tocar o que eu quisesse. Nunca imaginei este encontro – contou emocionado Rochembach, ao final do show.
Para finalizar, os quatro no palco fizeram uma apresnetação única, que não teve ensaio algum, alternando improvisações com as conhecidas melodias de dois sucessos nordestinos, Feira de Caruaru e Asa Branca, de Luiz Gonzaga.
Nesta exótica mania de brincar com o ar por meio de sanfonas de tecido e botões, em formatos variados, Pelotas recebeu o mestre da atualidade nesta antiga arte.
Carlos Dominguez/Da Hora
Deixe um comentário